sábado, 9 de novembro de 2013

O fracasso do Estado brasileiro


Alberto Magalhães*

O Estado é o guardião da ordem pública e do bem estar social e deve providenciar tudo o que for necessário para que o cidadão tenha preservados a sua saúde física e mental, a sua vida, a sua integridade física, o seu patrimônio e a sua educação pela qual haverá o eficiente médico, o professor, o juiz, o engenheiro, o legislador... Esses são os serviços essenciais prestados pelo Estado e em seguida, o cidadão deve ter ao seu dispor transporte, água e luz. Devemos lembrar que saneamento básico consta do rol prioritário na assistência à saúde.

O que vemos diariamente no Brasil, através da mídia, é o caos no transporte público e tantas comunidades sem saneamento básico, água potável, luz elétrica, escola, posto de saúde e delegacia de polícia operante. Vemos meliantes enfrentando a Polícia (portanto, enfrentando o Estado) em guerrilhas, com fuzis e metralhadoras, invadir órgãos de segurança para soltar criminosos e se apossar de armas do Estado, executar policiais e outros agentes da autoridade estatal, contrabandear armamento de grosso calibre em grande quantidade, explodir caixas eletrônicos, estabelecer e consolidar o tráfico de drogas mais facilmente que indústrias e empresas legais conseguem se estabelecer. Também vemos um número alarmante de homicídios, roubos e menores inseridos na marginalidade.

Mas para demonstrar o fragoroso fracasso do Estado brasileiro ainda falta o fator da impunidade e de outro que falarei mais à frente. A impunidade não só é um mal que prestigia o mal original, como também gera a perigosa cultura da vantagem pessoal. Ora se outros se safam impunes eu também poderei sair impune, ou seja, eu também quero esse benefício concedido historicamente aos que tiveram acesso ao poder ou ao muito dinheiro.

A pressão social, no Brasil, ao invés de acabar com a impunidade e a corrupção alargou a abrangência destes entre os agentes públicos administrativos e políticos. No entanto os lesa-pátria estão incomodados com os baderneiros nas manifestações populares. Claro, eles não querem os holofotes apontando para a verdadeira baderna que eles fazem com as finanças públicas. Eles que negam ao cidadão mais modesto a oportunidade de ter dignidade social, sem a qual a dignidade humana fica relegada a uma simples teoria.

Já o outro fator, o ingrediente final, a cereja do chantilly do comprovado fracasso retumbante do Estado brasileiro é a propagação pelas autoridades, constituídas para promover a saúde, a segurança e a educação de que lhes faltam os recursos necessários para cumprir o seu dever, para oferecer ao cidadão os direitos essenciais que dão sentido a formação de uma sociedade civilizada, governada por um Estado democrático de direito.

O carimbo do fracasso aparece quando vemos um chefe de Estado (seja presidente ou governador) dizer que não tem recursos suficientes para a saúde e a educação. Quando vemos um gestor da pasta da saúde dizer que existe a grande demanda porque o povo adoece demais ou que está vivendo mais – porém não vive melhor, por causa exatamente da ineficiente política estatal de saúde. Quando o governo diz que no Brasil não há médicos suficientes para atender a população.

Quando vemos os chefes ou comandantes de polícia a toda hora falarem que não existem policiais suficientes para dar segurança à população, mas “vão fazer um remanejamento de policiais” para determinada área. Esses brilhantes “estadistas” vão tirar policiais de onde? Dos 2 % que estão lotados em outros órgãos? Ora a defasagem de efetivo é de 100 %, em geral. O mesmo acontece com relação a juízes e promotores. Os processos se arrastam lentamente, ora em desfavor da sociedade, nos crimes, ora em desfavor dos cidadãos, na área cível. Além do atraso doloso do Estado – leia-se, gestores mal intencionados - em cumprir com a sua responsabilidade de pagar os valores devidos.

O fracasso do Estado está anunciado quando estudiosos do Brasil informam que existem mais de 100 mil criminosos para serem presos – grande parte por vários mandados de prisão - e que em cada 100 criminosos que não são presos em flagrante apenas 20 deles são identificados, 10 são presos e só cinco cumprem pena. Estou usando dados “redondos”, aproximados. Resolvida essa demanda todo o efetivo – já defasado - do judiciário precisará crescer vertiginosamente. O fracasso do Estado está visível quando vemos faltarem celas para abrigar os que estão foragidos ou prestes a delinquir, ou mesmo suficiente para os que já estão recolhidos no sistema penitenciário.

Mas todo mundo sabe que há recursos suficientes para todos esses serviços essenciais, sabe que boa parte deles é desviado para os bolsos de gestores públicos da União, dos Estados e dos Municípios, que os recursos são gastos com as mordomias e benesses desses gestores, que os recursos são mal usados em obras superfaturadas e de má qualidade - que logo se acabam e têm que ser feitas de novo, que também servem para pagar os CCs de assessores políticos desnecessários, e em valores maiores que pagos aos CCs técnicos, e que há gasto demasiado com a propaganda política dos governos.

Quando temos conhecimento de que existe mal uso dos recursos nas casas legislativas do país e em setores do judiciário, e de que o Brasil permanece no topo da lista mundial de índices do atraso e da injustiça social, depois de tanta luta de brasileiros contra a ignorância, a pobreza e a desonestidade, na construção de uma identidade nacional digna, nos vem a impressão de que já é tarde demais para reparar as variadas mazelas impregnadas em nosso país pelo iníquo sistema político que nos rege.

Alberto Magalhães é funcionário público do Estado de Sergipe e presidente do Centro de Estudos e Ação para o Progresso Humano e Social – CEAPHS.

 

segunda-feira, 23 de julho de 2012

O idealismo político morreu?


Os regimes totalitários de esquerda e de direita denominados comunista, socialista, fascista, nazista, suprimiram um dos três atributos essenciais do ser humano: a liberdade. Juntamente com a vida e a saúde, o livre pensar e agir possibilita a plenitude do ser significando essa tríade o valor humano primordial: vida, saúde e liberdade do corpo e da mente. A liberdade inclui o pensamento autônomo, a expressão livre deste e a legitimidade das ações supervenientes. As condições cultural, social e econômica determinam a forma de se usufruir esses atributos, sendo essas formas de usufruto elementos complementares aos três recursos primeiros da humanidade. 

Esses elementos secundários formam os fatores fundamentais da existência humana que subsidiam a ação dos elementos essenciais primeiros, mas nunca servirão para suplantar a importância destes.  O ser humano sempre busca mais para preencher todas as suas carências, que são muitas e em áreas diversas, por isso se enreda em teias que, muitas das vezes, são difíceis de livrarem-se depois. Seja no campo afetivo, social, político, ideológico, religioso.
Os teóricos das doutrinas políticas usaram o pensamento ideológico da igualdade (no uso de bens materiais) para, por meio da manipulação das massas, chegar ao poder e estabelecer as suas ideias.  Ocorre que essas doutrinas que embasaram os regimes totalitários não conseguiram unir os valores de igualdade e liberdade. Reprimiram as liberdades de expressão, política, cultural e incentivaram a alienação religiosa. E economicamente não obtiveram êxito, vez que deixaram de ter acesso aos países do bloco politicamente adversário. 

A direita reacionária em todo o mundo difundiu a ideia de que os regimes de esquerda eram a personificação do mal, contrários à caridade e inimigos de Deus. Ocorre que os governos totalitários da extrema direita também eram repressores da liberdade e inimigos da igualdade, legando ao Brasil maldita herança de atraso educacional, cultural, institucional, político, permeado de corrupção e promiscuidade do poder público com o empresariado, este último explorado pelos impostos extorsivos do governo, para pagar a malversação do dinheiro público. Ao final quem paga a conta maior são os trabalhadores. 
As democracias têm sempre optado pelo enfraquecimento do parlamento – o mais legítimo representante dos cidadãos -, fortalecendo as funções de Estado e assegurando vasto poder ao governante numa cópia má disfarçada do totalitarismo que predominava nos regimes de esquerda e de direita, descritos nas primeiras linhas acima. E são governos ditos “democráticos”, mas sempre baseados na centralização de decisões políticas e administrativas, na manipulação das decisões político partidárias, na ingerência legislativa, no conservadorismo das políticas públicas fundamentais, no empecilho às mudanças na conjuntura fiscal, tributária, administrativa, política, etc.
No Brasil, o parlamento se desmoralizou desde quando passou a aceitar as benesses do executivo aceitando ser apenas um colegiado que subscreve o que é do interesse do governo e dos grupos financeiros poderosos, perpetuando o domínio econômico e a prosperidade financeira nas mãos de poucos. Os partidos políticos, agremiações sem efetiva definição política, não contam mais com a credibilidade e o engajamento dos eleitores, pois não há correntes sérias adeptas de vertente programática conservadora ou progressista. 

Os partidos são organicamente fracos, fantoches dos interesses dos seus “donos”. Hoje se vota em candidatos que apresentam uma trajetória de aparente coerência com o seu discurso político pessoal – o político é quem dá visibilidade ao partido e não o contrário -, e nos candidatos que compram votos das lideranças políticas menores, inseridos na lista de ccs nos gabinetes políticos e padrinhos de comunidades carentes. 
Então qual idealismo impulsiona o povo, as massas atualmente? A utópica social democracia, que ingenuamente “prega uma gradual reforma legislativa do sistema capitalista a fim de torná-lo mais igualitário, geralmente tendo em meta uma sociedade socialista” (www.wikipedia.org) ou o neoliberalismo que impõe a absoluta liberdade do mercado, praticamente anulando o Estado regulador?
Em verdade, no imaginário popular, essas questões são mais uma superficial corrente do pensamento coletivo que ideologia no seu sentido amplo. As pessoas comuns, que são a maioria do povo, não atentam para essas peculiaridades das teorias políticas. Elas acompanhavam o discurso da direita e da esquerda, fazendo opções, em virtude da polarização das ideias, o que facilitava a compreensão das pregações de ambos os grupos - com seus sofismas e promessas vazias -, vez que se excluíam mutuamente numa dualidade útil aos integrantes dos grupos dominantes que usufruíam o poder. 

A ideologia do bem comum parece não existir mais, a não ser no discurso dos ideólogos pretendentes ao poder. As sociedades foram usadas, exploradas, enganadas e depois de tantas repressões, mortes desnecessárias, gastos com armas de guerra, crises na economia e diante do descrédito das ideologias humanas de redenção social do homem agora se voltam à busca das obras estruturantes, dos serviços públicos de qualidade, dos projetos de administração pública de excelência, da educação em todos os níveis, da moralidade no serviço público... Sem os discursos populistas e demagógicos, voltamos ao patamar inicial da civilização.
Alberto Magalhães

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Temas atuais I

A desagregação social no Brasil

A ignorância do povo é o suporte do sistema na sua estratégia secular de conduzir as massas populares como se fosse impotente em resolver efetivamente os conflitos resultantes das relações sociais. A iniquidade governamental, é notório, não atinge o cume da pirâmide social. Antes lhe é aliada contra os interesses daqueles que estão fora do círculo vicioso do poder temporal, notadamente nos países pobres ou emergentes.

O grupo que detém o poder econômico, em sua promiscuidade com o poder político, sempre resistiu às mudanças sociais impondo exclusões. Pobreza e degradação humana são os resultados mais perversos de uma nação injusta. Todos os deveres da lei (inclusive fiscal) são para os pobres, embora os direitos nem sempre. A teoria do sistema, aplicada até nas “democracias”, diz que os cidadãos privilegiados devem ficar imunes às consequências da degradação da sociedade, por isso os setores de repressão devem funcionar exemplarmente. Mas a hipocrisia permite que se diga que a preocupação real é com o povo.

O descaso quanto à efetiva consolidação do estado de direito é tão arraigada na nossa cultura que se sacrifica a dignidade e o bem estar dos trabalhadores comuns – matéria prima do desenvolvimento da nação - pelo lucro especulativo das elites. A questão abrange a qualidade de vida nas cidades, a degradação ambiental – com a invasão de mangues para moradia, o surgimento de favelas, o desemprego, a mendicância, as hordas de doentes, o aumento da criminalidade. Tudo isso gera um retorno desagradável e perigoso para todos. Causa uma instabilidade social, a vulnerabilidade – em todos os sentidos - do cidadão, a impotência do Ser diante da sua realidade. Este Ser, base e objetivo do pacto social no sentido mais nobre de sociedade: igualitária, justa e fraterna.

As gritantes desigualdades sociais desgastam a democracia, relegando a própria condição humana e redundam numa traição histórica. Aliado à corrupção alimentam a miséria, que gera a degradação social. Enquanto se der prioridade aos acontecimentos secundários e não às causas, há de se promover as mazelas a todo o corpo social, quando se pensa que o faz apenas aos seus membros menos ilustrados. A elite não pode viver sem contato com a plebe da qual, inclusive, de certa forma tende a tornar-se refém, caso semelhante ao do feitiço que se vira contra o feiticeiro.

Os jornalistas, os professores, os políticos idealistas, os escritores são importantes instrumentos para que possamos repensar todas essas questões a partir dos diversos prismas no interesse de nos conscientizarmos sobre a nossa realidade e perspectiva. Como disse o escritor Ernesto Sábato, “Pode haver um confronto de ideologias, mas não uma crise de ideias... assim como nada justifica a tortura, nem que as crianças morram de fome”.

Alberto Magalhães

Sobre o direito de livre expressão
Nós, brasileiros, Integramos um mundo globalizado, interagimos com o que há de melhor nas sociedades organizadas cultural e politicamente. Não somos estáticos. Desde 1988 estamos acompanhando o modo dinâmico, evolutivo, democrático das melhores civilizações, que sacramentam os direitos essenciais da pessoa humana por sobre o autoritarismo histórico do Estado e acima da imunidade – e vontade - dos governantes e gestores públicos que, ao final, são meros representantes do povo. O ordenamento jurídico moderno tem diminuído consideravelmente essa imunidade legal, que tanto serviu para as reiteradas práticas de perseguições e crimes diversos, cometidos sob o indelével e doloroso manto do silêncio do povo vitimado. 

O Brasil consolidou os direitos fundamentais da pessoa humana “Rompendo com o ordenamento constitucional anterior e demonstrando o surgimento jurídico de um novo Estado. A Constituição federal se fundamenta em cinco princípios: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político como fundamentos do Estado democrático de direito que é a República Federativa do Brasil”. Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Se a sociedade reprovou e sepultou a inquisição, o muro de Berlim, o apartheid, o fascismo, o nazismo, as ditaduras militares (no Brasil e mundo a fora), e até mesmo o pátrio poder extinguindo o papel do homem como o “chefe de família”, o que dizer da repressão à manifestação do pensamento quando em seu bojo não há a mentira orquestrada com o intento apenas de macular a imagem de terceiros? Deve ser assegurado por todos, em todos os segmentos sociais, a liberdade de expressão, seja na forma falada ou escrita. Poder-se-ia proibir o macaco de pular e se coçar, o passarinho de sibilar e voar, o peixe de nadar e o homem de pensar e falar (ou escrever) sobre o seu pensamento revelador e renovador, completando, assim, o seu ciclo produtivo?  Essa revelação traz à realidade o que era apenas imaginário. 

A fala, o pensamento externado do homem é ele propriamente revelando e afirmando a sua individualidade, é a manifestação do seu ser interior, espiritual. Impedir isso é querer anulá-lo, reduzi-lo apenas a carne e ossos. Tornando-o um escravo do Estado, não um cidadão. Quem não pensa estagna e não evolui. E esse foi, por muito tempo, o instrumento de subjugação das massas pelos tiranos. A expressão emergida do pensar livre é de tal forma forte e realizadora que se sofreu, se morreu e se matou por ela. E assim deve ser. A expressão ideológica é a fonte da resistência à opressão. Essa tese encontra sua força na antítese da intolerância e se consolida como síntese redentora para a luta libertária, que em sua última expressão é a luta pela igualdade incondicional. Quanto maior for a repressão, maior será a resistência a ela.
A sociedade moderna tem rejeitado o arbítrio, o autoritarismo e tem legitimado os mecanismos de libertação do cidadão do jugo estatal danosamente repressivo a livre expressão do ser humano, com sua carga ideológica. A sociedade moderna vedou a repressão e a censura à manifestação de pensamento e de opinião, sendo contrária a qualquer forma de cerceamento da expressão em todos os segmentos da sociedade. 

Não se exclui nessa finalidade as instituições públicas civis ou militares. Ao contrário, o Estado como curador mor da defesa ampla e irrestrita de todos os direitos legítimos da pessoa humana sob o seu alcance, deve ser o primeiro a respeitar, fomentar e estabelecer o efetivo Estado democrático de direito.


Para se comprovar o fortalecimento da cidadania do brasileiro, nestes tempos, basta se observar a promulgação da Constituição cidadã de 1988, o fortalecimento do Ministério Público, a criação do Habeas Data, dos estatutos do idoso e do menor, da lei “Maria da Penha”, da “ficha limpa”, a criação da lei que tipifica o crime de tortura, praticado pelos agentes do Estado, notadamente, e do crime de assédio moral praticado pelos superiores funcionais. Ora o superior hierárquico tem o dever de ser superior – ao menos igual - ao subordinado, em correção na sua conduta e ser um exemplo de democrata para todos. Não se deve retroceder.
Alberto Magalhães                 
Justiça, o que é?
Há pessoas que parecem usar a sabedoria para adornar a sua inteligência, parecem ter a capacidade de administrar (com seu julgamento) questões de forma coerente e moderadora (considerada satisfatória para uma parte e razoável para a outra) ao menos diante do que se lhe apresenta como matéria para análise e posicionamento.

Muitas vezes o que há por trás ou nas entrelinhas e algumas questões são mistérios intocáveis pelo direito teórico e formal, que serve como instrumento ao intelecto do julgador. Há pessoa que deixam essa boa impressão ao discorrer sobre matéria submetida ao crivo do seu entendimento na sentença proferida.

Isso faz com que a parte oprimida se sinta sendo notada de verdade e sendo respeitada a sua fala, com a credibilidade que ela merece, que a de todo mundo merece como escreveu Voltaire, ainda que a nossa opinião seja contrária. Quando a nossa fala é ouvida (não a de outro que nos representa), mesmo que desenhada de forma simbólica no papel e ainda que, a meu ver, a justiça não tenha sido plenamente alcançada porque ela seja, talvez, um espectro da consciência, uma idealização surgida de um sentimento, não algo que se possa alcançar plenamente.

Porque nunca sacia completamente quem a busca. Justiça é algo intangível, desafiada pela realidade existente a se concretizar de forma profícua. Não existe “ato de justiça” que anule a injustiça feita e os efeitos consequentes. Ela já foi sentida e vivenciada. Nada volta no tempo para antes do mal haver sido feito. O direito perdido está perdido nas entranhas do tempo que passou. Outro será dado, não mais aquele que se foi.

A injustiça é uma flecha lançada no espaço, que os membros do judiciário tentarão alcançar para reter os seus efeitos e anular a sua gênese. Na verdade, só conseguirá minorá-la. Não reverterá o que aconteceu. Mas transformará, a partir da decisão cumprida em favor da vítima, a injustiça reinante com um ato de justiça. Não devolverá ao autor o ato de injustiça que ele praticou ao lhe tomar o bem que ele, de outrem, se apropriou e o devolvendo ao seu legítimo proprietário, a não ser que permita ao injustiçado que também lhe tome um bem que seja de sua propriedade legítima.

Ainda assim haveria uma sucessão de injustiças, entremeado com um ato de coerção jurisdicional, não a consumação da lídima justiça, o que seria, em verdade, o não se apropriar do que é de outrem. Inclusive dos bens abstratos como o sossego e a paz.

O sistema estatal que trata do direito e da justiça na terra, apenas é um reflexo pálido do celeste. Uma sombra do ser real. A Justiça é um atributo irrevogável de Deus. Embora o Poder Judiciário alimente a expectativa dela, traga a esperança dela ser restabelecida quando os homens integrantes das elites política e econômica estiverem sob o seu completo alcance, sob o inteiro domínio da autoridade do Estado – inclusive os próprios membros do judiciário.

Quando não houver nenhuma promiscuidade entre os integrantes dos poderes constituídos e os detentores do poder econômico (o 4º poder) para distorcer o direito e perverter a justiça. Enquanto houver um evento desses, muitos hão de querer ingerir nas causas sub judice. Quando houver verdadeira igualdade entre todos – desde as iniciais apurações – nas demandas suscitadas com sua consequente e justa sentença, ainda não haverá como já foi dito, a lídima justiça na sua essência, mas ao menos na sua forma, na administração que se busca para ela no contexto social.

Os legisladores criam as leis que concedem os nossos direitos e impõem que os nossos direitos sejam cumpridos e o Estado tenta pôr ordem em meio a tendência natural ao caos social, em virtude da ação humana danosa ao outro (disse que o homem é o lobo do homem). Mas é o judiciário quando funciona bem e corretamente que desestimula as práticas arbitrárias do cidadão contra outro, em grupo ou só, representando o Estado ou a si mesmo.

Eu venero o direito da pessoa humana se expressar porque Deus criou o mundo pela Sua palavra e pela palavra nós nos manifestamos melhor sobre tudo o que importa. Os gestos são insuficientes para que possamos informar, requerer, dialogar, nominar e se revelar.

Por isso transcrevo aqui, para a nossa reflexão, esta frase com sua implícita sabedoria: “Só ouve direito quem se liberta dos preconceitos; e só se liberta dos preconceitos quem é capaz de restituir a palavra ao silenciado” (Frei Antônio Moser).

Um exemplo emblemático nessa questão da importância da palavra foi o do ex-presidente africano Nelson Mandela que teve que passar quase toda a sua vida na prisão (tornado, assim, um mártir) por causa de sua palavra libertária e transformadora, punido com a força maligna da intolerância humana. Na terra a justiça é, talvez, o sonho mais bonito e utópico daqueles que amam o bem.

Alberto Magalhães

Temas atuais II

Sobre o sistema prisional brasileiro
Sobre os que estão nas prisões sabemos que em outros tempos, em vários lugares, muitos deles estariam mortos sob aplicação da pena capital. Muitos acusados de crimes, culpados ou não, foram enforcados, crucificados, fuzilados, guilhotinados, lançados ao mar, açoitados até a morte, atravessados à espada ou pela lança. Penas nem sempre legítimas ou justas. Por causa disso a pena capital foi abolida no mundo e em algum local onde ainda existe sempre surgem notícias de condenações equivocadas. Então, nesses casos, a sociedade se fez ratificadora do Estado arbitrário, carrasco dos seus próprios cidadãos. E ainda assim não se repeliu o crime nessas localidades. 

E quem pode dar garantias de que sob a pena de prisão também não houve e não há pessoas punidas injustamente? Atualmente as penas aplicadas passaram teoricamente a ter o objetivo de ser educativas, ressocializadorasComo se ensinar ao contraventor, delinquente, marginal o respeito à lei para reger a sua conduta, se a sociedade em parte a despreza quando da aplicação dessa mesma lei ao acusado? Se, como ocorre a eles, os cidadãos buscarem a sua aplicação sob o aspecto da conveniência, não na sua totalidade? O verdadeiro cumprimento da lei, que impressiona e ensina, não é aquele que nos faz conceder ao outro o direito que nós não gostaríamos de dar? E nos faz cumprir deveres que não nos são gratos? 


O infrator precisa de exemplos contundentes da dignidade humana a embasar-lhe a superação de suas deficiências na busca de princípios éticos e morais norteadores de uma conduta digna. E isso só é possível ao se aplicar as penas legais ao infrator lhe concedendo efetivamente cada direito possível que a lei não lhe tolhe ou restringe como o acesso a colchão, lençol, toalha, produtos de higiene íntima, revista, livro, medicamentos, etc. geralmente levados pelos seus familiares. Além do acesso à instrução escolar e religiosa e às informações seculares.
Nesse ambiente inóspito as diferenças não são levadas em consideração. Se junta o iniciante praticante de um crime de leve potencial ofensivo à população com o reincidente praticante de crime hediondo, o infrator fortuito com o contumaz, o detento de sessenta anos com o de dezoito, o homossexual com o homofóbico. 

É essa noção de legalidade, justiça, civilidade, dignidade que a sociedade quer lhes ensinar, modelo do Estado de direito que pretendemos estabelecer? Deve haver o controle social efetivo sobre o sistema prisional aniquilante, com sua arcaica política de segregação do infrator das regras legais. Cidadão x lei. Infrator x sociedade. Tentemos fazer do sistema prisional uma ferramenta eficaz na resolução desse conflito histórico.
A ação do agente policial é diferente da ação do agente prisional, mesmo que sejam atribuições exercidas pela mesma pessoa, como acontece nas delegacias de Polícia. O primeiro tem que identificar, localizar, enfrentar, manietar, dominar o infrator e levá-lo à prisão. O segundo tem que mantê-lo na prisão contra a sua vontade. Mas como deverá ser esse regime prisional? Quais os objetivos válidos desse regime? O que deve ser alcançado de profícuo nesse regime para proveito da sociedade? Ainda são repetidos os equívocos do passado, de resultados inócuos na instrução ou de efeito mais nefasto na volta do infrator para a sociedade que não só o puniu, mas se vingou? 

Quais as verdadeiras funções do agente prisional em suas atribuições de agente do Estado impessoal e legalista? Eu, como agente da lei, por várias vezes, fui o prendedor de pessoas por algum ato delituoso, o seu opositor físico em algum embate surgido, o acusador na inquirição formal como seu condutor, o carcereiro na sua custódia, mas também fui de forma diligente o seu “socorrista” nos casos de enfermidade e o seu protetor contra as investidas de parte contrária, como deveres do meu ofício. E por que isso? Porque a pessoa sob a custódia do Estado tem deveres e direitos assegurados pela lei que rege esse Estado, lei que lhe faculta o poder-dever de custodiar definitivamente ou cautelarmente e lhe atribui responsabilidades.
Percebemos então que a função estatal vai além de excluir da vida social o ente extraviado dos bons princípios que fazem saudável o corpo social. Não temos autorização legal para excluir o infrator do amplo alcance da lei, nem da humanidade da qual é constituído. Deve ser a lei o que repreende e instrui, priva de funções e imprime noções – ainda que por caminho inverso - de civilidade, pune e ampara, exclui para enfatizar e preservar os valores sociais. Excluir nesse sentido não é anular indefinidamente.

É afastar para ser consertado, restaurado, impedido de prosseguir no seu feito danoso e multiplicador de danos. Mais que apenas razoavelmente inibir, coibir o ato criminoso, antissocial devemos estabelecer modelos que façam os errantes – principalmente os mais jovens e as futuras gerações - ver a lei como a maior aliada que temos para alicerçar a plena cidadania, conquistar a melhor qualidade de vida. Enxergar que nos direitos do outro estão assegurados os direitos de todos, portanto os nossos.
É deprimente a visão das carceragens como deprimente foi a visão de cenários de crimes que foram perpetrados por vários dos que estão nelas.  No entanto o Estado não deve se igualar aos infratores na produção de ambientes, estruturas e esquemas degradantes como o são no submundo do crime. Um sistema prisional justo para ensinar ao preso a justiça da sua prisão. Torná-lo um alvo da aplicação diligente, eficiente e contundente da lei e ainda assim um seu beneficiário, não um desvalido dela. O Estado como aquele pai que disciplina, pune e sustenta o filho nas suas necessidades. Sem paixões, o Estado é impessoal. Como não foi na ditadura militar e em outros regimes de exceção.
No Brasil se prende por menos tempo para se compensar a omissão do Estado, ou das autoridades que o compõe, no tratamento adequado, produtivo - sob os aspectos a que se propõe - ao interno prisional. Concedemos um terço, remição, regime semi aberto e aberto, indulto, etc. Primeiro se morde muito para depois soprar. Por isso existe a prisão especial para os privilegiados, porque é realmente necessário no contexto atual ao menos a sua separação, e trinta anos é a pena máxima adotada para quem tenha sido descoberto praticando uma lista interminável de crimes, mesmo os hediondos. 

Faltam elementos básicos na ressocialização do interno prisional: educação fundamental, curso profissionalizante, palestras edificantes e motivadoras nos depósitos dos excluídos repreensíveis e estigmatizados, sedados moral e civicamente, esperando o dia em que a sociedade vitimada lhes dará o passaporte para retornar ao seu convívio, pior do que saíram. Levados a se reconhecerem eternamente como deformados, párias. Sentenciados ao fracasso total e definitivo, mesmo os bem jovens. Nascidos com baixa consciência moral e espiritual e depois desumanizados, tornados irremediáveis pelo sistema. Quando muitos poderiam ser reformados.


Por tudo isso exposto consideramos necessário uma reconsideração na aplicação da política estatal de custódia dos presos brasileiros, no interesse final de proteger a sociedade de reincidências delituosas dos que também estão sob a égide da lei, sob a responsabilidade objetiva do Estado.


Alberto Magalhães


Interpretações
Comentário acerca de críticas ao artigo "sobre o sistema prisional brasileiro"
As pessoas geralmente não deturpam as coisas ditas (ou escritas) simplesmente porque não entenderam direito, mas porque fingem não entender e fazem oposição (muitas vezes velada) ao enunciado, movidos por seus interesses pessoais. 

Quanto mais profunda for a percepção do pensamento e a sutileza na explanação do enunciado mais contradições vão alegar que estão contidas nele, além de que vão buscar outras razões para depreciar os argumentos ou para desmerecer a pessoa do enunciador, como se uma coisa dependesse da outra para ser, para existir como verdade fatual.
Quando se defende a condição humana de uma pessoa custodiada pelo Estado, sob a guarda de um agente público, essa exposição não se refere a nada além da observação dessa condição na custódia estatal obrigatória, não retroage à atuação anterior do ente custodiado, motivadora da medida retaliadora oficial. Nem tampouco adentra outros meandros da questão, como a má conduta carcerária. 

Essa percepção trazida à lume para clareamento das mentes obtusas trata apenas da parte ontológica da questão - condição humana/desumana -, promovida por pessoas integrantes de uma sociedade que se diz humana, civilizada, digna. Ademais nem todo mundo hoje que profere a palavra – ou a escreve - para deleite do espírito, preocupa-se mais com a sua imagem produzida pelos levianos de plantão.


Não se acha mesmo muitas referências confiáveis para nos servir de parâmetro. A máscara dos “homens de bem” da atualidade paramentados em ternos, togas ou vestes sacerdotais, bem como agraciados por títulos e cargos, há muito caiu nesta nossa nação (tributo às honrosas exceções).

A inocência das massas, hoje, é uma quimera. O corporativismo indecente e nocivo dos segmentos sociais formais já está posto a nu e o povo explorado, desacreditado do sistema estatal e saturado dos esquemas institucionais viciados fará uma desconcertante revolução nesse país onde se brinca de fazer democracia para finalmente e não tardiamente chegar ao domínio do poder, ao pleno exercício do governo do povo, pelo povo, para o povo.
Alberto Magalhães 

Temas atuais III


A mediação promissora 

A proposta da mediação de conflitos é antes de tudo uma proposta pedagógica. Um novo paradigma na intermediação de conflitos. Ela apresenta um procedimento informal ou menos formal, descentralizado. Visa descaracterizar qualquer exercício de poder sobre o outro. O ponto central da audiência deixa de ser as questões alegadas desencadeadoras do conflito, ou seja: uma atitude ou uma omissão, um prejuízo material ou imaterial causado, os interesses contrariados, as diferenças conflitantes. A figura central desse encontro interpessoal também não é o dirigente da audiência. 

O ponto central da mediação passa a ser as pessoas envolvidas no conflito a ser tratado. Ou melhor, essas pessoas é que vão ser naturalmente induzidas a se deixarem ser trabalhadas, tratadas como fator essencial no entendimento do conflito, com o intuito delas descobrirem por si mesmas a verdadeira origem, as razões reais de haver sido deflagrado o conflito, chegando à conclusão final das inclinações pessoais que possam possibilitar a geração de determinados conflitos. Visa desfazer as sentenças unilaterais e os sofismas embutidos, restabelecendo a dignidade humana dos litigantes.
Como descreve o ilustre professor Juan Carlos Vezzulla, “a mediação não opera de forma impositiva, assistencial ou punitiva, antes o seu modelo de interação subsiste na forma participativa, dialética, cooperativa. Fugindo da superficialidade formal.” Dessa maneira visa o esclarecimento, de forma aprofundada, dos conflitos mútuos que gera o conflito central, se propondo a ser o canal restaurador do diálogo, da capacidade das pessoas exporem, de forma proficiente, suas limitações e expectativas, juntas construindo o caminho para a resolução pacífica do litígio. Evitando assim o agravamento e a “judicialização” do conflito.
PS. O Prof. Juan Carlos Vezzulla foi palestrante no I Congresso internacional de mediação de conflitos/Sergipe, organizado em parceria da UFS e TJ/SE, ocorrido em 14 a 16/09/2011.
Alberto Magalhães, participante da oficina do Congresso.
Já foi dito que o Brasil não pode crescer se valendo, principalmente, dos recursos naturais disponíveis no país que, a médio e longo prazo, tendem a se exaurir. Também é verdade que nenhum país deve adotar essa política perniciosa ao meio ambiente, devastadora dos recursos naturais de uma civilização, como fizeram os países que se desenvolveram antes de nós e que hoje são os primeiros a nos criticar, o que por outro lado não justifica a desordenada exploração desses recursos por nós, além do seu desperdício constante. 

O seu uso deve se dar de forma econômica e racional, já que esses recursos se esgotam e já estão em adiantado processo para tal. Estamos já sofrendo o aquecimento global, as rápidas mudanças climáticas, as tragédias súbitas da natureza violentada. O desenvolvimento sustentável se dá na exploração gradativa, responsável e inteligente do solo, da água, das matas, que se não naturalmente são potencialmente renováveis, do petróleo e minérios (recursos não renováveis).

 Devem ser viabilizadas urgentes e efetivas ações voltadas ao reflorestamento, à conservação efetiva dos rios, à manutenção de reservas biológicas, ao incentivo à reciclagem, às pesquisas e à conservação da biodiversidade promovendo a discussão desse tema sob o prisma da biologia genética para além da esfera acadêmica. Deve haver uma fiscalização permanente dos poderes públicos e dos cidadãos contra a exploração clandestina dos recursos naturais nacionais.

Para ser possível que se abra mão do modelo atual de crescimento econômico será preciso estimular a poupança doméstica nacional, exercer severo controle sobre as contas públicas (com uma auditoria rigorosa sobre a dívida pública da união que consome quase metade do orçamento nacional e fomenta a especulação financeira), e promover relevantes investimentos na infraestrutura do país, num moderno sistema de saneamento básico, na capacitação tecnológica, na educação em todos os níveis escolares e na capacitação profissional das pessoas que não chegarão aos cursos superiores. 

A atual política econômica adotada no mundo capitalista é altamente deletéria aos recursos naturais, ao meio ambiente, à boa qualidade de vida e fatalmente será aniquiladora da própria vida. Triste sociedade que é governada por políticos profissionais, com seus projetos particulares de poder.
Alberto Magalhães

Brigar
Há uma substancial diferença entre “brigar” e se desentender (buscando o acerto ou o realinhamento), contestar (ou debater em busca de razão pessoal), questionar (as sentenças preconceituosas, os “esquemas” sociais que embute os “esquemas” corporativos com sua promiscuidade deletéria).  

Brigar é ir às vias de fato, ofender com palavras de baixo calão ou ameaçar de ação violenta. Violência física, moral, psicológica, etc. são práticas altamente reprováveis atualmente na civilização. No entanto, insurgir-se contra atos, posturas ou omissões que atingem o insurgente em sua integridade moral, profissional, social, religiosa, espiritual, etc. é revelar a humanidade que aflora sempre que a sua dignidade é banalizada.

Monstros como Adolf Hitler, Stalin e outros ditadores no oriente e no ocidente contaram com a colaboração de cidadãos comuns, profissionais vários, políticos, intelectuais, religiosos, militares, mulheres, autoridades, cientistas e educadores para consolidarem os seus projetos hediondos. Ou seja, a colaboração de pessoas “de bem”. As multidões do amém não questionam porque não buscam justiça nem o bem comum e acham que os fins justificam os meios. 

E ainda portam-se como superiores ou especiais por seus projetos mirabolantes, danosos e egoístas executados. No sentido ideológico “brigar” com os “importantes” é sinal de que não se é lacaio de ninguém. A questão é que quando se é lacaio por vontade própria, geralmente se é por razões mesquinhas.

Há que ser humilde sem, contudo, perder a noção de dignidade. Há que ser contestador sem, jamais, perder a ternura. (Parafraseando Che Guevara, um antidemocrata e anticapitalista sanguinário e inteligente, que é idolatrado pelos capitalistas ignorantes). No final da história – quando o deus dos homens estará finalmente morto (como profetizou Nietzsche), toda a vontade de Deus prevalecerá.

Alberto Magalhães
A criminalidade na mídia
A questão da criminalidade no Brasil é interessante. Nas manchetes policiais aparece: “Polícia prende quadrilha de assaltantes” e no dia seguinte: “Quadrilha assalta mansão de desembargador”. No outro dia: “Bandido é morto e outro preso em tentativa de assalto”, já no outro dia: “Policial é morto por bandidos fortemente armados”.

Iniciou-se a disputa pelos quinze minutos de fama? Porque o que vemos é uma atividade das duas forças (a pública e a marginal) aparecendo na mídia, em forma de ping pong: toma lá, dá cá. Quando vemos e ouvimos sobre prisões e confrontos entre policiais e bandidos, já não sentimos mais conforto no Estado protetor, mas passamos a notar que os bandidos passaram a se impor e mostrar força e destemor. 

Ora se há grandes prisões e grandes combates quase todos os dias é porque há grandes bandidos e fenomenal resistência às políticas (?) de segurança pública ou ao que há de mero esboço nesse sentido. Há Estado brasileiro que se a população fosse escolher um símbolo para a SSP do seu Estado, com certeza escolheria um simpático espantalho para representá-la, (o que, ainda, não é o caso de Sergipe), mediante as condições gerais em que as polícias se encontram.
Alberto Magalhães

Uma tribuma para o povo
(Homenagem ao Cinform, representando toda a imprensa)
A quem a democracia inspirou? Quem sentiu um arrebatamento no peito por um ideal nobre? Ou quem amou a justiça em momentos de ímpetos sublimes qual paixão juvenil (mas que ficou?). Olho e vejo um Dom Quixote com ares de modernidade a lutar contra vilões reais, enquanto outras pessoas meneiam a cabeça ou olham com desdém: “louco, tolo...” Pensam.
Triste ironia ou sorte cruel, esses mesmos que o criticam um dia – pelo menos um dia, tiveram a honra de sonhar os mesmos sonhos no mais genuíno, autêntico sentimento de patriotismo, civilidade, humanidade que torna o homem digno, em busca do essencial. Hoje se omitem fascinados pelas luzes fáceis, artificiais que não iluminam de verdade, mas deixam uma penumbra envolta em uma aura de falsa decência.
Ele (Dom Quixote) vive de palavras – e palavras são vida. Elas expressam todos os sentimentos, emoções, experiências e, fortuitamente, revelam segredos do coração. E mais que isso: quando usadas com coragem, impulsionadas pela indignação ou simplesmente pelo dever, produzem efeitos, invocam ações, mobilizam pessoas e instituições gerando justiça, quando possível, ou manifestando a injustiça encoberta.
Espinhosa missão. Deturpada por uns, subestimada por outros, porém cale-se e dentro de uma sociedade que será ilimitadamente oprimida, as pedras clamarão. Só quem não tem a consciência cauterizada pode medir – nos seus integrantes, o grau de desprendimento do pessoal, do conveniente em favor do coletivo. 

Eu aprendi uma grande lição ao te observar melhor. Para mim tu és um dos reflexos da esperança social, instrutor de causas nobres (que vivenciamos – e não que teorizamos – no dia a dia), convertedor de pensamentos que, por consequência de fatores contrários, estavam desgarrados do legítimo Estado de direito, alma sublime da democracia. Outra palavra não fictícia, mas viva, real. Tu geras algo que é contrário das palavras individualismo, inconsciência, material. Mas eu prefiro não dizer na esperança de que cada um, de si, o decifre.
Fevereiro de 1995.
Alberto Magalhães